Livestock Research for Rural Development 18 (6) 2006 Guidelines to authors LRRD News

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Ocorrência de fungos no feno de grama-batatais (Paspalum notatum) em função da dose de uréia, período de tratamento e do teor de umidade

J C de Carvalho Almeida, F T de Pádua, D de Deus Nepomuceno, N Silva Rocha, T Oliveira da Silva e A de Moura Zanine*

Departamento de Nutrição Animal e Pastagens do Instituto de Zootecnia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro,
23.851-970 Seropédica, Rio de Janeiro, Brasil
jcarvalho@ufrrj.br
* DZO/UFV

Resumo

Objetivou-se avaliar o efeito da adição de uréia (0, 0,5, 1,0, 1,5, 2,0 e 2,5%), nos períodos de tratamento (21, 28 e 35 dias) e teor de umidade (11 e 25%) sobre a concentração de fungos no feno de grama-batatais. Não foram observadas diferenças estatísticas (p>0,05) entre as idades (21, 28 e 35 dias) e amostras recém colhidas e amostras secas.

Mas foi observado diferenças significativas (p<0,05) sobre os teores de umidade e as doses aplicadas. A concentração de 2% de uréia foi eficiente nos três períodos estudados (21,28 e 35 dias), pois, promoveu a menor concentração de colônias de fungos. Observou-se menor ocorrência de fungos nas doses de 2 e 2,5% de uréia na amostra seca. Ressalva deve ser feita no sentido que a concentração de 2,5% de uréia, promoveu uma redução em torno de 25% em relação à concentração de 2%, apesar de não ter sido verificado diferença estatística A adição de uréia é eficiente em reduzir a colonização por fungos em feno de grama batatais, independentemente da idade de corte.

Palavras-chave: Amonização, conservação, gramínea



Occurrence of fungi in the hay of batatais-grass (Paspalum notatum) according to the level of urea, period of treatment and content of humidity

Abstract

It was aimed to evaluate the effect of urea addition (0, 0,5, 1,0, 1,5, 2,0, 2,5%), in the treatment periods (21, 28 and 35 days) and humidity about the concentration of fungi in the hay of batatais-grass.

It was not observed statistical differences (p>0,05) among the ages (21, 28 and 35 days) and samples recently picked and dry samples. However it was observed significant differences (p <0,05) on humidity content and applied doses of urea. The concentration of 2% of urea was efficient in the three treatments. The concentration of 2,5% of urea, promoted a reduction around 25% in relation to the concentration of 2%, in spite of the difference not reaching statistical significance.

The addition of urea appeared to be effective in reducing mold colonization in hay of batatais-grass, independently of cutting age.

Keywords: Ammoniation, conservation, grass, hay


Introdução

A fenação como prática de conservação de forragens tem apresentado boa eficiência no suprimento de volumosos para a época seca do ano. Porém a colheita durante o verão pode dificultar o processo de secagem a campo, devido ao risco de perdas pela ocorrência de chuvas. O tratamento com aditivos pode ser uma boa opção para o armazenamento do feno com teores mais altos de umidade. Entre as substâncias disponíveis para a preservação de fenos, a uréia anidra (NH3) tem lugar de destaque em função de sua ação fungistática. Pesquisas têm mostrado a viabilidade do uso da uréia como fonte alternativa de adição de uréia (Rosa e Reis 1995; Reis et al 1997; Rosa et al 1998).

Nas regiões tropicais do Brasil, a produção estacional de forragem é um fato concreto que tem causado enormes prejuízos à pecuária nacional, pois a maioria dos produtores não se prepara para suplementar o rebanho no período de escassez com forragem de boa qualidade (Cândido et al 1999), mediante o exposto, pode-se sugerir, que a fenação seja uma prática que pode garantir o fornecimento de forragem de alta qualidade durante o período de escassez de alimentos provenientes das pastagens (Reis et al 1997).

O tempo requerido para secagem da forragem no campo até atingir o conteúdo de umidade apropriada para armazenagem tem limitado a produção de fenos de boa qualidade, pois, freqüentemente, podem ocorrer chuvas antes que o feno esteja no ponto de cura (13 a 18% de umidade), aumentando assim as perdas e decrescendo a sua qualidade (Rosa et al 1998).

O enfardamento e recolhimento da forragem com conteúdo de umidade superior a 20% reduzem o tempo de cura após o corte no campo e pode diminuir consideravelmente as perdas durante o processamento, contudo, aumentam as perdas no armazenamento, pois a atividade fúngica é a principal causa de deterioração de fenos armazenados nessas condições (Gregory 1963; Lacey 1975; Lacey et al 1981; Hlodversson e Kaspersson 1986).

No momento do armazenamento, o feno contém diversificada população de microrganismos, sendo que o contato com o solo e a contaminação pelos equipamentos mecânicos são importantes fatores que contribuem para a composição desta microflora (Kaspersson et al 1984).

Rosa et al (1998), trabalhando com feno de Brachiaria decumbens, observaram que condições climáticas desfavoráveis durante a secagem no campo podem resultar em elevado crescimento de fungos saprófitas, tais como Fusarium, Alternaria e Cladosporium.

Produtos químicos podem ser usados com a finalidade de reduzir as perdas que ocorrem desde o corte até o armazenamento do feno, considerando que o efetivo tratamento destes pode reduzir o crescimento de microrganismos nos mesmos, diminuindo as perdas no armazenamento e preservando a qualidade destas forragens (Rotz et al 1990). Avaliando os efeitos da amonização sobre a qualidade dos fenos de gramíneas tropicais, Reis et al (1991) relataram que o período de tratamento tem influência acentuada sobre as alterações na composição química dos volumosos tratados.

Pelo exposto, este trabalho tem por objetivo avaliar o efeito da adição de uréia, do período de tratamento e do teor de umidade sobre a concentração de fungos no feno de grama-batatais (Paspalum notatum).


Material e métodos

O presente experimento foi conduzido no Setor de Forragicultura e Pastagem do Departamento de Nutrição Animal e Pastagem do Instituto de Zootecnia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, localizado no município de Seropédica, na região da baixada fluminense do estado do Rio de Janeiro, situado a uma latitude de 22045`S, longitude 43041'W, com uma altitude média de 33 metros. O clima da região é do tipo AW, pela classificação de Köppen. A região apresenta duas estações distintas, uma seca, que se estende de abril a setembro e outra quente e chuvosa, que se estende de outubro a março. Levantamentos dos últimos dez anos mostram precipitação média anual de 1281,7mm. As temperaturas médias anuais máximas e mínimas são respectivamente 29,8°C e 20,1°C.

Foram coletadas amostras de grama-batatais após corte por roçadeira nos gramados da UFRRJ. As amostras foram coletadas no dia do corte (alta umidade-25%) e no dia seguinte (baixa umidade -11%). O material foi armazenado em sacos plásticos, seguindo-se a amonização com uréia nas doses de 0 (controle); 0,5; 1,0; 1,5; 2,0; e 2,5% com base na matéria seca. Foram observados três períodos de tratamento (21, 28 e 35 dias). No momento do corte as plantas estavam com 21 dias de crescimento. Após os períodos de tratamento, os sacos foram abertos e retiradas amostras para avaliação da ocorrência de fungos (UFC-Unidades Formadoras de Colônias) pelo método de vazamento em placas (Cruz 1985; Samson et al 1966).

No material com alto teor de umidade a uréia foi distribuída sobre a forragem e misturada para obter uma maior homogeneização e em seguida colocada em sacos plásticos vedados e, no material com baixo teor de umidade a uréia foi diluída em água e depois essa solução foi aspergida sobre a forragem e da mesma forma colocada em sacos vedados. Após a vedação dos sacos, os mesmos foram colocados sob lona preta. Após o término de cada período de tratamento os sacos foram abertos e esperou-se dois dias para que a uréia restante fosse eliminada e depois desse período foi retirada uma amostra de cada parcela e enviada ao Departamento de Microbiologia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ para que se avaliasse a ocorrência de fungos, identificação e quantificação dos mesmos.

Os resultados foram analisados em um delineamento em blocos ao acaso, segundo um esquema fatorial 3 (período) x 6 (doses) com 3 (repetições). Para análise dos resultados foi utilizado teste de regressão para a variável doses e períodos de tratamento e teste de Duncan ao nível de 5% de significância para teor de umidade. Foi utilizada uma transformação logarítmica em todos os dados antes de se efetivar as análises estatísticas devida à grandeza numérica.


Resultados e discussão

Não foi observada diferença estatística (p>0,05) entre as idades (21, 28 e 35 dias) e amostras recém colhidas e amostras secas. Mas foi observado diferenças significativas (p<0,05) sobre os teores de umidade e as doses aplicadas.

Como pode ser observado na tabela 1, a partir das doses de 2% de uréia já foi suficiente para inibir o crescimento de fungos, pois o mesmo, não diferiu do tratamento com 2,5% de uréia.


Tabela 1.  Efeito de doses de uréia na concentração de fungos, em três períodos de tratamento do feno de batatais (média de três repetições)

Doses de uréia, %

Dias de amostragens dos fenos

21

28

35

2,5

3,45b

2,99b

2,39b

2,0

3,98b

3,57b

3,03b

1,5

4,22a

3,62a

3,81a

1,0

4,34a

4,13a

4,25a

0,5

4,46a

4,28a

4,36a

0

4,63a

4,49a

4,94a

Médias seguidas de mesma letra, na mesma coluna, não diferem, pelo teste de Ducan, ao nível de 5% de significância


Para as demais concentrações, houve maior concentração de fungos e não houve diferenças estatísticas. A concentração de 2% foi provavelmente, suficiente para reduzir o valor do pH, sendo responsável pela redução da UFC, no referido tratamento. O que pode ser confirmado por estudos realizados por Henning et al (1990) que observaram que a aplicação de uréia em níveis superiores a 1,2% da matéria seca foi efetiva no controle da população de fungos e leveduras, controle associado à elevação do pH nos fenos tratados.

Conclui-se que independente da idade de colheita da planta com o objetivo de fenar, a concentração de 2% de uréia, inibiu o crescimento de fungos. O que está de acordo com Evangelista et al 2004 que também verificaram que a aplicação de 2% de uréia na matéria seca inibe a indicidência de fungos. Na figura 1 é apresentado o comportamento da ocorrência de fungos de grama batatais em função de doses de uréia, bem como, a devida equação.



Figura 1. Ocorrência de fungos de grama batatais em função de doses de uréia

Na tabela 2 observa-se que as menores ocorrência de UFC foram verificadas nas doses de 2 e 2,5% de uréia na amostra seca. Tendo as mesmas não apresentando diferenças significativas (p>0,05).


Tabela 2.  Efeito de aplicações de uréia na concentração de microrganismos, em função da umidade da amostra (média de três repetições)

Doses de uréia, %

Amostra recém colhida

Amostra seca

2,5

3,09a

2,80b

2,0

3,53a

3,52b

1,5

4,10a

3,87a

1,0

4,17a

4,30a

0,5

4,46a

4,27a

0

4,57a

4,46a

Médias seguidas de mesma letra, na mesma linha, não diferem, pelo teste de Ducan, ao nível de 5% de significância


Ressalva deve ser feita no sentido que a concentração de 2,5% de uréia, promoveu uma redução em torno de 25% em relação à concentração de 2, apesar de não ter sido verificado diferença estatística. Na prática, seria interessante indicar uma dosagem de 2,5% de uréia para o tratamento do feno de grama batatais, justamente para se ter maior segurança na conservação da mesma.

Thorlacius e Robertson 1984 relataram que o feno de capim Brachiaria tratado com 3% de uréia e enfardado com umidade de 20%, apresentou menor incidência de fungos. Enquanto, Reis et al (1993) avaliando o efeito da aplicação de uréia (0, 1,5 e 3%) em feno de Brachiaria decumbens com 15 e 20% de umidade, observaram uma redução na incidência de fungos, principalmente com a aplicação de 1,5% de uréia, independente a umidade. Nascimento (1994) utilizando feno de grama paulista (Cynodon dactylon) armazenado com alta umidade observou-se a eficiência da uréia anidra no controle do crescimento de fungos, em especial o gênero Aspergillus, durante o período de armazenamento (30 dias).

Em um experimento com feno de alfafa contendo umidade de 13, 30, 40 e 50%, Ghates e Bilanski (1979) testaram os efeitos da aplicação de diferentes quantidades de uréia (0, 1,75, 3,5 e 5,3% da matéria seca) e observaram o aumento no pH (como resultado da hidrólise da uréia e reação com água) e a diminuição na incidência de fungos, após 60 dias de armazenamento nos fenos tratados com 5,3% de uréia. Valor este muito superior ao observado no experimento para reduzir a UFC. Reis et al (1997) e Rosa et al (1998) observaram um controle eficiente de fungos, quando utilizaram a dose de 1,8% de uréia. Valor este próximo ao determinado no presente experimento. Na figura 2 pode-se observar o comportamento da ocorrência de UFC no feno de grama batatais em função de doses de uréia e teor de umidade, bem como as referidas equações, representado pela alta e baixa umidade.



Figura 2. Ocorrência de UFC no feno de grama batatais em função de doses de uréia e teor de umidade


Conclusões


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Received 2 September 2005; Accepted 20 March 2006; Published 15 June 2006

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